terça-feira, 30 de agosto de 2011

"Olhos abertos até o infinito"

Tive a oportunidade de visitar algumas escolas aqui da Província,tão pobres como no nosso  país, o Brasil,  mas lamentavelmente mais pobres do que as nossas. Aqui esqueceram até que as crianças precisam se alimentar, pelas três escolas que pude passar não existe “merenda”, não existe água para beber e nem para lavar as mãos,livros?cadeiras? brinquedos? Nem pensar!
Um professor e suas mais de 50 crianças, salas sem carteiras,um lugar de muitas esperas... cadernos bem sujinhos, um quadro negro que se basta ...mas nos olhos uma vontade grande de aprender...No mestre uma angústia maior, pelo saber não tão bem compartilhado. Conseguem sobreviver  com um salário de extrema pobreza, em média recebem 120 a 180 dólares por mês,na moeda local 3600 meticais ou um pouco mais a depender de sua formação(vale lembrar que 1kg de carne custa em média 500 meticais).São também uns heróis, na sua maioria homens, quase não vimos professoras, numa escola de 11 docentes só uma era professora.
Presenciei  crianças soltas a correr pela escola, pude vê-las assistindo aula debaixo de uma árvore...e todas em extremo silêncio e respeito por aquele que lhes falava...Assim  encontrei o grande escritor moçambiquense, Mia Couto,  para me dizer algo sobre a condição de estudar nesse país:
“Em uma sociedade que é muito pobre, às cinco da manhã, às vezes eu saio de casa e vejo as pessoas já acordadas, atravessando quilômetros a pé, andando 30, 40 quilômetros para ir à escola, saindo de casa sem o café da manhã e tomando simplesmente uma xícara de chá com muito açúcar para dar energia, para ir para a escola aprender. Eu tenho um prazer enorme de ir às escolas em Moçambique, porque os meninos estão ali com uma fé quase religiosa. Eles estão ali absorvendo, têm os olhos abertos até o infinito, estão completamente ali. Não se ouve uma mosca passando na sala. É um investimento que eles fazem em uma outra esperança, em uma outra crença. É impressionante. Mas há escolas em Moçambique nas quais eu não vou: a escola americana, por exemplo, que é uma chatice. É uma vida feita de facilidades, em contraste com essa vida de conquistas, em que as pessoas têm de sair de manhã e têm de lutar. Às vezes nem tenho coragem de perguntar a esses meninos o que eles fizeram para chegar à escola naquele dia. Muitas vezes o giz é feito com pau de mandioca seca. Às vezes, não há sala. É uma árvore. E não há cadeiras, as pessoas sentam no chão. No entanto, aqueles meninos estão todos os dias ali na escola, assim como os professores. Isso é uma grande esperança. É um universo de gente que sabe que tem de fazer isso para construir uma vida diferente. É uma grande escola.”
É isso...uma grande escola estar aqui podendo aprender com essa gente tão forte e perseverante!
Duas escolas...duas realidades!

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