Numa semana marcada pela acentuação de descobertas em torno do querer...
do ter...
do confiar e se entregar,
Percebo o quanto da busca por um amor de verdade nos imobiliza a alma e o corpo.
É quando já não se tem mais o que dizer nem provar,
quando se busca a todo custo provar o quanto de bem querer se tem
e ao mesmo tempo diante do fracasso de se provar ter que recuar,
de repente você se vê num campo de batalha
de ideias e palavras que vão perdendo o sentido
na sua fugaz velocidade
de representações e sentidos.
O que fica?
O que sobrou?
Havia amor?
Ou era só vapor que novamente volta a ser Líquido.
Que troço é esse que não tem consistência?
Que se desmanchou feito "espumas ao vento".
Vazio
Tristeza
Dor!!!
Assim está o lugar que antes foi ocupado pelo dito
AMOR!
Bauman e a dificuldade de amar
Anna Carolina Pinto
Zygmunt Bauman é
autor de inúmeras obras com a palavra líquido em seu título. A noção de
liquidez proposta pelo filósofo e sociólogo polonês, falecido no começo desse
mês, é aplicada aos mais variados temas como a modernidade, o amor, o medo, a
vida e o tempo, expressando a fluidez, isto é, a imensa facilidade com que
estes elementos escorrem pelas mãos do homem moderno. A idéia, extraída de “O
Manifesto Comunista” de Marx e Engels, vem da célebre afirmação de que tudo que
é sólido se desmancha no ar e de que tudo que é sagrado é profanado: assim é a
modernidade e sua essência que se alastra pela vida do homem moderno
transformando-o não só como indivíduo, mas também como ser relacional.
O primeiro livro do
Bauman que li foi “Amor Líquido” o qual, carinhosamente, valendo-me das
palavras de Caetano, defino como “um sopapo na cara do fraco”, que me fez e
faz, já que essa sorte de questionamento é constante, pensar na forma como nos
relacionamos hoje em dia. Um ponto alto do livro, aos meus olhos, é o capítulo
no qual Bauman fala sobre a dificuldade de amar o próximo destacando o modo
como lidamos com os estranhos. Penso que nessa dificuldade é que se encontra a
raiz de tantos dos nossos problemas seja na esfera pessoal ou pública. E é
sobre isso que eu gostaria de refletir conjuntamente hoje.
Vivemos em uma
sociedade fortemente marcada pelo conflito ser x ter na qual o homem passa a se
expressar pelas suas posses, elementos definidores de sua própria identidade, o
que reflete na busca por certa conformidade que ceifa a pluralidade de
existências e segrega o que é diferente, estranho. O modo como as cidades se
dividem é exemplo disso, os nichos considerados seguros são aqueles onde todos
se parecem, exacerbando a nossa dificuldade em lidar com os estranhos que passam
a ser evitados através de sistemas de segurança, muros, priorização de espaços
que assegurem a conformidade de seus freqüentadores como os shoppings e etc.
Evitar a todo custo o incômodo de estar na presença de estranhos, começar a
enxergar naquele que sequer se sabe o nome um inimigo em potencial e desconfiar
de tudo e de todos só é possível graças ao desengajamento e ruptura de laços
para o sociólogo polonês.
Se levarmos em
conta que amar outra pessoa não é amar o que projetamos nela e sim a sua humanidade
e singularidades, não será difícil compreender que o amor é um desafio nos
tempos de modernidade líquida. A busca pela felicidade individual nos
transforma em tribunais individuais e, na disputa pela sentença a ser
proferida, não raro, o que se vê é sair vencedor aquele que se recusa a ouvir o
outro. Facilmente, pois, livramo-nos dos compromissos e de tudo aquilo que nos
pareça incômodo. Ainda que tão agarrados a nós mesmos, paradoxalmente, é
bastante comum que a solidão seja companhia (e problema) constante de quem vive
a descartar.
Os muros que
construímos ao nosso redor, físicos ou emocionais, têm mesmo esse condão de
isolar e criar dois mundos em cada um de seus dois lados: o de dentro e o de
fora. O último, espaço cativo dos que nos incomodam- aqui incluídos tanto quem
nos relacionamos de forma íntima, quanto aqueles que preferimos distantes,
inviabilizados de estar perto, enfim, aniquilados ao prender, matar, limitar a
circulação, fixar em zonas periféricas e etc. É que Narciso acha feio tudo que
não é espelho, já diria, mais uma vez, o sempre genial Caetano Veloso.
Dessas reflexões
que vão (muito) longe e que, por ora, encerro aqui fica sempre uma mensagem
muito clara para mim: amar (mesmo) é um ato revolucionário e só ama quem tem
coragem o bastante pra lidar com esse desafio porque sabe que, por mais que nem
tudo sejam flores, esse amor “sólido” é que nos impulsiona a querermos ser
melhores seja como pessoa ou sociedade. Parece distante e utópico, mas está
dentro de nós: ame profunda e verdadeiramente. Até quem você não conhece.
*Anna
Carolina Cunha Pinto, colunista da Revista Prosa, Verso e Arte, escreve
no primeiro e terceiro sábados do mês sobre suas percepções do mundo
associando-as com conteúdos de Filosofia e Sociologia. Formada em Direito pela
Universidade Cândido Mendes, mestranda em Sociologia e Direito pela UFF e
apaixonada por filosofia.
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